Hoje senti vontade de escrever em meu caderno como fazia minha infância e adolescência toda, mas aí então percebi que já nem me lembro mais a quanto tempo não escrevo cadernos de pensamentos e desabafos. Costumava ter um para cada ano, e os guardava a sete chaves para que ninguém os encontrasse. Hoje vejo que tanto cuidado para guardar meus segredos não foram o bastante pois os perdi de vista a muito tempo e nem me dei conta. Onde foram parar? Será que alguém leu? Não sei, apenas sei que que é assim que vamos levando a vida. O que mais abandonei? Você se lembra de tudo que abandonou?
Quantos hábitos e coisas que nos faziam felizes deixamos pra trás sem percebermos?
Ainda hoje me pego assistindo desenhos tentando encontrar a mesma graça que via quando era criança, ou revendo aqueles antigos tentando entender porque me encantava tanto naquela época e hoje parece que são totalmente sem sentido. Você já não os vê mais da mesma forma. Tudo se perdeu, a inocência se perdeu juntamente com sentimentos e emoções que tomaram conta de tal modo que parece na maioria das vezes que estamos vivendo dopados, drogados de uma inércia mórbida e sem nexo.
O tempo tem passado, e passado de maneira tão rápido, embora no meu interior pareça que continuo o mesmo de dez anos atrás. Uma pena meu corpo não comportar isso e a idade ser visível nele. Enfim… isso é algo que não da para controlar, mesmo que eu quisesse me congelar no tempo. Na verdade eu queria poder congelar acontecimentos. Sei la, parece que no passado tudo era tão intenso e vivo, e hoje em dia mesmo que eu faça as mesmas coisas do passado, parece não ter o mesmo sentido, o mesmo sabor, o mesmo cheiro. As vezes tenho a impressão que aos poucos estou esquecendo como ser feliz, e que isso acontece com a maioria, devido a rotina repetitiva do cotidiano.
Queria poder voltar ao passado, naquela época em que fazia de conta que era gente grande e imitava os adultos a minha volta. A vida deles parecia tão simples, tão serena e equilibrada. E hoje em dia isso não acontece, acho que o peso das obrigações distorce o sentimento que se tem sobre eles. Agora não da pra brincar de ser gente grande, porque se eu brincar, amanhã posso correr o risco de não ter o que por na mesa pra comer, ou uma casa pra dizer que é minha. A vida tornou-se apenas ir e vir, fazer acontecer e não deixar este ritmo pausar, não deixar a bola rolar ribanceira a baixo, é preciso segura-la e guia-la por caminhos em que outras pessoas não possam rouba-la de você, porque se roubam, é a sua vida que levam, e todos os esforços que fez para mantê-la erguida e avante.
Pra onde você esta levando a sua bola? Já se perguntou? Eu vejo as pessoas correrem tanto, se arriscarem tanto, apostarem tanto, e tudo para levar esta bola até o gol, e dizer:Venci!!!!!! E então eu me pergunto; será que a vida se resume apenas em fazer pontos? Em chegar ao destino final e este destino necessariamente tem que ser a vitória? Vejo pessoas que mal olham o trajeto que fazem, que mal prestam atenção no que estão deixando cair, ou no que estão carregando e acumulando.
E meditando sobres estas coisas, cheguei a conclusão que estou perdido no meu trajeto, que realmente não tenho nem a mínima ideia de pra onde estou levando minha bola, apenas de que estou a carregando pra lá e pra cá.
Sempre fui uma pessoa que andou pelos caminhos certos, e com a ajuda dos meus dons, sempre soube onde estar e o porquê de estar, embora meu coração sentisse um vazio e quisesse que a vida me reservasse surpresas e me fizesse rever o mundo com outros olhos. Até que um dia, decidi abandonar tudo e me perder para poder me encontrar. As vezes penso que as pessoas deveriam fazer isso, pois sabem tão poucas de sí mesmas, por que se preocupam apenas em chegar ao gol.
Eu precisaria começar do zero, ser como um recém nascido. Ver o mundo e as pessoas como elas realmente são, não como eu gostaria que fossem. Porque embora eu não vivesse em mundo de fantasia, eu procurava dar um empurrãozinho, deixar tudo sob meu controle, os acontecimentos e as pessoas. E com isso ia me afastando do amor, da felicidade, da cumplicidade, do afeto e de todas as coisas que vamos deixando se tornar superficiais devido a correria de querer levar a bola ao gol.
Então assim eu fiz, me perdi, e vejo o mundo e o ser humano na sua forma mais bruta, posso ver suas intenções e seus sentimentos como sempre, mas não tento mais molda-los, apenas deixo a vida seguir seu fluxo.
E este fluxo na maioria das vezes consiste em lidar com as coisas de forma natural. Umas pessoas me magoam, outras me fazem rir, algumas tentam me ridicularizar, me fazem sentir um nada, já outras me levantam, me animam. Umas estão ali apenas por estar, algumas separei em grupos; aquele que saio para me distrair, aquelas que saio para debater assuntos que gosto, outras pra falar absolutamente nada com nada, uma ou outra para desabafar, mas quase nenhuma para contar meus segredos, para me abraçar de forma singela e abrigar meu coração cansado, posso contar nos dedos aquelas que estiveram do meu lado e segurou em minhas mãos e mesmo sem dizer nada me trouxe uma sensação de alento e paz. Na verdade o único ser humano que faz isso é minha mãe, embora seu jeito humilde e por vezes distante, mesmo que estivesse ali, só onde esta está, sentia como se nada no mundo pudesse me ferir. É tão cruel caminhar mundo a fora tendo que se proteger o tempo todo, se esquivar o tempo todo do mau, do infortúnio, da falta de amor e escrúpulos de muitos. Pergunto-me se o ser humano vai amar uns aos outros da forma como uma mãe amo seu filho, se poderemos nos sentir um dia abrigados e acolhidos neste mund
Um dia me disseram que este mundo seria minha casa, minha morada e que as outras pessoas seriam como irmãos pra mim. Mas até hoje precisei erguer paredes altas pra me proteger de algo, me fechar e deixar de ser eu mesmo. Andar entres as pessoas tentando ser um holograma, do qual pudessem me ver mas não pudessem me tocar. Porque toda e qualquer aproximação que se tem com o outro pode ser interpretado de uma forma errônea. As pessoas temem a aproximação, são desconfiadas, retraídas, não sabem lidar com alguém que é o contrário, que sabe demonstrar o seu amor, sua cumplicidade, seu afeto. Estão constantemente com um pé atrás, por medo de sofrer, de serpassado uma rasteira, de serem traídas, de se decepcionarem. E por isso é que repito muitas e muitas vezes, que é muito cruel viver em mundo assim, é triste, porque todos nós queremos e precisamos de carinho, de atenção, de um amigo pra contar sempre, queremos tanto andar desarmados, sem medo no coração, sem repudia da parte de alguns, sem o preconceito, andarmos livres, de braços e corações abertos. Sem o peso do escudo.
Estamos agora, todos juntos, correndo pra la e pra cá com a nossa bola, temos tanto em comum, tanto pra compartilhar. Os seu sonhos não são diferente dos meus, não são maiores e nem menores do que o do seu próximo. Você é uma criança, desprotegida e desconfiada, com medo de não chegar ao gol, não estar sozinha um dia, de não ser reconhecida, de não ser lembrada. Você é tão bom, tem tanto amor dentro de você, tem tanto potencial pra fazer deste mundo, um lugar de paz. Você pode ser rico, pode ser pobre, pode achar que é mais que os outros devido sua posição social, você nem tem ideia do que que esta acontecendo fora do seu mundinho, e no fim você não tem nada, não é nada, não será nada depois daqui. Ou seja, pra que isso? Para que tanta prepotência? Tantos julgamentos? Tantos roubos e rasteira? Pra que tanta mágoa neste seu coração? Por quê? Porque foi traído? Te iludiram? A vida não foi junta com você e por isso se vinga de todos? Quer se auto afirmar ou se afirmar para os outros?
Você esta se esquecendo daquela criança que deixou no passado, aquela mesma que sentiu medo por ser abandonada, ou rejeitada, aquela que sentiu medo do dentista, da injeção, ou daquela que sempre quis ter tido este cuidado e não teve. Da criança que queria ser incluída nas brincadeiras, ser escolhido na salada mista, de ser o policial e o detetive, que dançou quadrilha, ou que quis um dia tudo isso mas não pode ter. Você esta se esquecendo daquela criança que brincou sozinha com seu amigo imaginário, que brincou de casinha ou de jogador de futebol, daquela que inconscientemente projetou nas suas brincadeiras e sonhos, a vontade de ter uma família, amigos, fazer parte de um grupo, de um time, de chutar a bola para seu companheiro sabendo que ele iria guia-la e depois te repassar. Você se lembra algum momento dela?
Estamos tão vidrados no destino, segurando nossa bola tão firmemente, que nos tornamos pessoas egoístas, mesquinhas, frias e tão preocupadas com o ter, que realmente não vemos o quão sem sentido esta a batalha. Batalha esta que esta para terminar. Logo mais o ser humano vai poder ver de forma mais cristalina e isso me tras esparanças.
É, hoje foi um dia daqueles em que não estou muito legal e tudo que menos queria é que este primeiro relato parecesse melancólico e deseperançoso. Será que estou agindo certo? Eu sei que tenho forças pra ir mais longe, e fazer bem mais, mas esta é a questão, tem dias que cansa ser forte o tempo todo, de carregar esta armadura pra onde quer que eu vá. O que ameniza tudo isso é pensar que muitos no mundo também fazem o que eu faço, o que me deixa feliz por um lado, porque não me torna único, não me faz sentir sozinho porque sei que você esta comigo nessa. Na verdade estar aqui é uma chance de reunir a familia toda, porque assim como eu existem muitos, só a espera de se encontrarem e voltar pra casa, ou almenos falar sobre ela e tentar tornar este mundo o que de fato ele foi criado para ser, e só quem pode ver tudo isso do alto, de um ponto mais alto nas estrelas é que vai compreender todas essas palavras que digo.